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28/02/2019

Fiscalização de criptomoedas deve avançar com norma proposta pela Receita Federal

Receita quer ter acesso a informações de modo a alcançar os bilhões movimentados, evitar evasão fiscal e lavagem de dinheiro com criptoativos

Em novembro de 2018, a Receita Federal do Brasil (RFB) realizou uma consulta pública (nº 06/2018) com a proposta de uma instrução normativa para fiscalizar a movimentação de criptomoedas. Com isso, as exchanges, corretoras que negociam e viabilizam as operações de compra e venda dos criptoativos, podem ser obrigadas a prestar informações que identifiquem tanto as ações quanto investidores.

O objetivo do órgão é utilizar a fiscalização como um meio de combater lavagem de dinheiro e alcançar, por meio do Imposto de Renda, os bilhões que são movimentados anualmente nesse mercado. A consulta foi encerrada em dezembro e ainda não está claro quando essa norma será aplicada.

A compra e venda de criptomoedas é feita pelo próprio investidor utilizando a exchange como um ambiente intermediário para movimentação, negociação e custódia. O pagamento por tais serviços pode ser feito, inclusive, com outro criptoativo. A moeda virtual mais comum no Brasil é o bitcoin, cujo preço da unidade está em torno de R$ 14 mil.

A movimentação das criptomedas como o bitcoin é feita pela tecnologia blockchain, espécie de sistema de base de dados que registra o envio e o recebimento de valores. Esses registros são protegidos por criptografia e distribuídos por computadores interconectados de participantes no mundo todo, de modo a garantir descentralização e segurança nas transações.

Segundo a Receita Federal, a negociação de bitcoins foi de R$ 44 milhões em 2014 para mais de R$ 8 bilhões em 2017. A Receita ainda não disponibilizou informações referentes à movimentação em 2018, mas estima que tenha sido entre R$ 18 bilhões e R$ 45 bilhões.

"Os números, e o seu crescimento anual, demonstram a relevância do mercado de criptoativos no País, principalmente para a administração tributária, tendo em vista que as operações estão sujeitas à incidência do Imposto de Renda sobre o ganho de capital porventura auferido", enfatiza a Receita Federal na instrução.

Pela mudança proposta, as exchanges devem informar data e tipo de operação, informações cadastrais dos titulares, criptoativo negociado, valor da operação, valor de mercado de cada moeda, taxas de serviços cobradas pela negociação, entre outros. Para fins tributários, as mesmas informações serão exigidas para transações intermediadas por exchanges que estão no exterior. As informações devem ser prestadas pelo sistema Coleta Nacional, disponibilizado no Centro Virtual de Atendimento (e-CAC) da Receita Federal.

A preocupação em torno das criptomoedas não é de hoje. Em 2017, o Banco Central emitiu um comunicado sobre elas. Entre vários tópicos, um se destaca: o órgão enfatiza que há riscos em se adquirir esse tipo de ativo, como a possibilidade de perda de todo o capital investido e de perdas patrimoniais.

A criptomoeda possui valor digital, mas não é emitida ou regulamentada pelo Banco Central. Dessa forma, as operações com moedas virtuais não são garantidas pelo Estado, o que as tornam menos seguras e exigem dos investidores menos aversão ao risco de perda decorrente da flutuação do preço.

Ainda assim, a Receita Federal equipara as moedas virtuais a ativos financeiros no que se refere à declaração no Imposto de Renda. Segundo o órgão, é necessário que as criptomoedas sejam declaradas na ficha "Bens e direitos" como "outros bens" pelo valor da aquisição. Como não têm cotação oficial, uma vez que não há um órgão responsável pelo controle de sua emissão, não há uma regra legal de conversão dos valores para fins tributários. Os ganhos com transações de moedas virtuais a partir de R$ 35 mil ao mês são tributados, a título de ganho de capital, com alíquota progressiva em função do lucro.

Segundo o presidente da Associação Brasileira de Criptoativos e Blockchain (ABCB), Fernando Furlan, uma regulamentação bem-feita, que não seja exagerada nem burocrática, pode ajudar o mercado a se consolidar, dar segurança jurídica ao usuário e investidor.

"Acreditamos que a Receita não foi precipitada, pois realizou consulta pública prévia e está analisando as sugestões enviadas, inclusive as nossas. Se a Receita vier a publicar portaria, seria importante que não impingisse custos demasiados a startups e empresas pré-operacionais, tão comuns nesse setor de criptoativos. A preocupação é com a imposição de custos operacionais que inviabilizem pequenos e inovadores negócios", pontua.

Fiscalização

Todas as exchanges do Brasil deverão entregar informações, segundo a norma. Quando a operação for realizada sem exchange ou com uma domiciliada no exterior, a pessoa física ou jurídica que comprou/vendeu criptomoeda deverá informar sempre que a transação mensal ultrapassar R$ 10 mil.

A Receita também deve exigir que as informações sejam prestadas no mês subsequente àquele em que a transação com criptoativo ocorreu. Ainda assim, o declarante precisará guardar os documentos e manter os sistemas nos quais as informações foram extraídas.

A Receita Federal detalhou as penalidades que devem ser impostas a quem omitir informações ou declarar informação errada ou incompleta.

As multas por prestação de informação fora do prazo são de R$ 500 por mês para pessoa jurídica cadastrada no Simples Nacional e em início de atividade; R$ 1,5 mil para empresas em outro regime tributário; e R$ 100 para pessoa física. As multas referentes à prestação incorreta, omitida ou incompleta é de 3% do valor da operação declarada erroneamente para pessoa jurídica e 1,5% para pessoa física.

A multa de R$ 1,5 mil também será aplicada à pessoa jurídica que na última declaração utilizou mais de uma forma de apuração do lucro ou tenha realizado operação de reorganização societária.

A multa será mantida ainda que haja indícios de ocorrências de crimes previstos na Lei n.º 9.613, que trata de lavagem de dinheiro; ocultação de bens, direitos e valores; e utilização do sistema financeiro para atividades ilícitas.

De acordo com o advogado especialista em Direito Tributário e CEO da consultoria especializada em criptomoedas Bitwolf, Rafael Steinfeld, a multa de 3% aplicável às pessoas jurídicas, referente à omissão de dados e informação errada ou incompleta, pode inviabilizar o trabalho das exchanges e impedir o crescimento do mercado, uma vez que a taxa de intermediação (que é a receita da exchange) é menor do que a própria multa eventualmente aplicada pela Receita Federal.

Ele explica como essas multas se enquadram na legislação: "Em regra, pelo princípio da legalidade, estabelecida no artigo 97 do Código Tributário Nacional, a instituição de multas só pode advir de Lei, o que não seria o caso [do que a Receita está estabelecendo], uma vez que essas multas seriam instituídas por instrução normativa. Nada obstante, a RFB inseriu a mesma multa genérica estabelecida pela Medida Provisória 2.158/2001 – apesar da existência de teses contrárias, o Poder Judiciário tem dado razão à Receita Federal do Brasil", esclarece.

Corrupção

A Receita menciona a possibilidade de que tais movimentações anônimas facilitem a corrupção envolvendo transações financeiras. Com as mudanças propostas, a Receita Federal deve aumentar a percepção do risco em relação a isso.

A advogada da Celso Cordeiro e Marco Aurélio de Carvalho Advogados e mestranda em Direito e Desenvolvimento pela Universidade de São Paulo (USP), Rhasmye El Rafih, explica em um artigo sobre criptomoedas e lavagem de dinheiro, publicado no site Consultor Jurídico, que a sofisticação tecnológica em torno da movimentação de moedas virtuais permite transações descentralizadas, sem limite de valor e à margem de fiscalização estatal, e isso preocupa as autoridades quanto à utilização dessas moedas para atividades ilícitas.

Ela pontua em seu artigo que "é necessário que haja um refinamento nos métodos investigativos e, simultaneamente, na própria blockchain, possibilitando a efetiva identificação de usuários, sem que as autoridades se empenhem em escamotear a expansão dessa tecnologia, em prol de uma cruzada distorcida contra o crime".

Como é em outros países

No documento colocado em consulta pública pela Receita Federal, é mencionado o trabalho feito por órgãos fiscalizadores na Austrália, que se concentraram em cobrar das exchanges facilidade para identificação de clientes, manutenção de arquivos por sete anos e detalhamento de movimentações acima de U$$ 10 mil para órgãos de fiscalização. A proposta também visou a impedir que recursos provenientes de movimentações anônimas fossem utilizados para financiar atividades terroristas.

Um esforço semelhante foi feito pela Comissão Europeia para que tais movimentações de criptoativos fossem regulamentadas, e as carteiras digitais, fiscalizadas. Na Coreia do Sul, a regulamentação das movimentações de criptoativos está imposta desde janeiro de 2017. Pelas regras vigentes, as exchanges têm a obrigação de pagar 24% da receita auferida no ano fiscal com tais operações, informa a Receita na instrução.

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